sexta-feira, 31 de dezembro de 2010



"Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo,

qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim "

Chico Xavier


Feliz Ano Novo para todos nós

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

as mãos do meu pai




As tuas mãos tem grossas veias como cordas azuis
sobre um fundo de manchas já de cor de terra
- como são belas as tuas mãos
pelo quanto lidaram, acariciaram ou fremiram da
nobre cólera dos justos.

Porque há nas tuas mãos, meu velho pai, essa beleza
que se chama simplesmente vida.
E, ao entardecer, quando elas repousam nos braços
da tua cadeira predileta,
uma luz parece vir de dentro delas...

Virá dessa chama que pouco a pouco, longamente,
vieste alimentando na terrível solidão do mundo,
como quem junta uns gravetos e tenta acendê-los
contra o vento?

Ah! Como os fizeste arder, fulgir, com o milagre das
tuas mãos!
E é, ainda, a vida que transfigura das tuas mãos nodosas...
essa chama de vida – que transcende a própria vida
...e que os Anjos, um dia, chamarão de alma.

Mario Quintana

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

all about soul

NGC 6302


She waits for me at night, she waits for me in silence
She gives me all her tenderness and takes away my pain
And so far she hasn't run, though I swear she's had her moments
She still believes in miracles while others cry in vain

It's all about soul
It's all about faith and a deeper devotion
It's all about soul
Cause under the love is a stronger emotion
She's got to be strong
Cause so many things getting out of control
Should drive her away
So why does she stay?
It's all about soul

She turns to me sometimes and asks me what I'm dreaming
And I realize I must have gone a million miles away
And I ask her how she knew to reach out for me that moment
And she smiles because it's understood there are no words to say

It's all about soul
It's all about knowing what someone is feeling
The woman's got soul
The power of love and the power of healing
...

do albúm River of Dreams de Billy Joel

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

oferecendo de beber a Pei Ti



Vem beber um copo e descansar,
os homens mudam sempre, como as ondas do mar.
Nós dois temos envelhecido juntos,
apesar dos reveses, continuamos vivos.
O primeiro a habitar uma casa de portões escarlates
pode sorrir, ao olhar os outros de chapéu na mão.
Tu sabes, basta um pouco de chuva
para reverdecer a erva dos caminhos.
O vento da Primavera é ainda frio
mas os botões das flores quase desabrocharam.
Por que tanta pergunta, tanta luta,
os negócios do mundo, as nuvens flutuantes?
Descansa, deixa fluir a vida,
e vem jantar comigo.

Wang Wei

domingo, 26 de dezembro de 2010

natais, duas festas dos loucos

.
Há dois Natais. Um que tem uma face pagã e outra cristã. Em termos cristãos, nele se celebra o nascimento de Cristo na terra ou, segundo os místicos, o nascimento do divino na consciência (como escreveu Angelus Silesius: “Que me importa que Cristo haja nascido ontem em Belém, / Se não nasce hoje na minha alma?”). Em termos pagãos, a celebração que foi cristianizada é a do Solstício de Inverno, ou seja, o renascimento simbólico do Sol Invictus após a sua simbólica morte: ou seja, o renascimento do próprio mundo, quando a energia vital que há nos seres e nas coisas, após declinar e se recolher, inicia um novo ciclo de expansão. O Deus cristão foi depois visto como um Deus crucificado, apontando um caminho de ascese e renúncia ao mundo, em prol de uma salvação sobrenatural, acessível apenas aos homens, destinados a uma eternidade separada dos animais que lhes serviram de companhia, alimento e força de trabalho. Todavia, como se assinala na inspiração franciscana do Presépio, ele veio ao mundo numa gruta, símbolo das profundezas da Natureza, primeiro que tudo aquecido e protegido pelos animais, uma vaca e um burro: poderoso símbolo de uma fraternidade divino-humano-cósmica, ainda por cumprir, tal como igualmente se expressa no “Jardim das Delícias”, de Bosch, ou nos quadros de Chagall, entre outros.

Este Natal, pagão ou cristão, implica sempre um (re)nascimento iniciático, uma metamorfose da consciência e das energias profundas do ser, um mundo ao arrepio das convenções, rotinas e usos comuns, em que a libertadora experiência do sagrado consiste em ridicularizar aquilo a que se está apegado como mais sagrado. Não é por acaso que, ainda na Idade Média cristã, o Natal coexistia, no período da libertas decembrica, com as Festas dos Loucos, celebradas de meados de Dezembro até à Epifania, em 6 de Janeiro, com comida, bebida e danças dentro das igrejas e em cima dos altares, missas paródicas com burros a zurrar, homens vestidos de mulheres e mulheres vestidas de homens, crianças entronizadas como Imperadores dos Inocentes, a quem os adultos e a hierarquia eclesiástica tinham de obedecer, etc. Progressivamente proibidas nas igrejas, acabaram por originar o Carnaval moderno, tendo sido a forma medieval e cristã do mundo às avessas que é ritualizado em muitas tradições e culturas como forma de recordar e vivenciar o regresso cíclico do cosmos ao Caos primordial ou ao Tempo das Origens onde tudo é puro, sagrado e possível e a liberdade, a metamorfose, o jogo e a festa predominam sobre a rígida delimitação do sagrado e do profano, do divino, do animal e do humano e dos papéis psicológicos, sociais e cósmicos, com a vida orientada para o trabalho e a produção. Correspondendo ao solstício de Inverno, herdam a memória de mais antigas festividades pagãs, de sentido carnavalesco, como as Saturnais, onde se celebrava o regresso à abundância e inocência da Idade do Ouro, com a troca de presentes e o travestimento de homens e mulheres. Festividades ainda bem presentes no Nordeste transmontano, de cuja inversão da ordem se acredita depender a renovação das energias humanas e cósmicas, a fertilidade das mulheres, dos animais e dos campos. Como ainda hoje se diz em certas aldeias de Trás-os-Montes, por ocasião das tropelias e mascaradas praticadas nas Festas dos Rapazes e outras: “É Natal, ninguém leva a mal!”. Um Carnatal, como pude presenciar…

Estas festas, tradicionais e iniciáticas, para além da catharsis das pulsões reprimidas, podemos entendê-las como convites à transmutação da consciência que assume e liberta a sua iluminada ou divina natureza primordial, anterior a qualquer estado, condição ou limite, anterior a qualquer máscara, ego e personalidade e sua projecção de um mundo ilusoriamente considerado como exterior, real e objectivo. O Louco simboliza bem, como na carta do Tarot, essa natureza primordial da mente, não egocentrada, sem centro nem periferia, tão livre e infinita como o espaço, tal um zero metafísico e pré-existencial que, por não ser nada, pode a cada instante imaginar-se e tornar-se tudo, como assume Bernardo Soares no “Livro do Desassossego”. Aquilo que todos somos: Todo o Mundo – Ninguém.

O Louco ou a Criança. Porque a Festa dos Loucos é a festa da coroação das crianças como detentoras da suprema autoridade, com a inversão das funções e relações habituais entre as classes etárias e sociais. A exemplo do ensinamento de Lao Tsé, Cristo e Agostinho da Silva. Tal como acontecia e acontece na Festa do Espírito Santo, sua directa herdeira no Ocidente, fundada pela rainha Santa Isabel e levada para os Açores, Brasil e América. Preservada ainda hoje no Penedo, perto de Sintra, com a mácula da tourada à corda. A Festa onde Agostinho da Silva viu a simbólica antecipação do futuro que todos desejamos: a libertação de todas as prisões, a igualitária partilha da abundância, a coroação e a sacralização da infância, ou seja, da inocência, da liberdade e da imaginação criadora.

Este é o espírito e o simbolismo profundo do Natal, do Presépio, da Árvore de Natal, imagem do axis mundi que liga Céu e Terra e passa em cada uma das nossas colunas vertebrais. O simbolismo da troca de prendas, da festa da infância e da abundância, da comunhão na alegria, na solidariedade e na despreocupação.

O outro Natal é o que hoje temos à nossa volta, a deturpação deste e do seu espírito num (fim de) ciclo de civilização em que o crescente vazio interior de mentes sem imaginação, amor e sabedoria se busca ilusoriamente compensar por um produtivismo e consumismo galopantes e ávidos, que alimentam uma economia regida por especuladores e agiotas, financiam guerras, trucidam milhões de seres vivos e envenenam e enchem de lixo o planeta para uma Consoada e um dia de Natal de embrutecimento e esquecimento da vida triste e opressiva levada em quase todos os restantes dias do ano. No fundo, e ainda, uma grande Festa de Loucos, mas não de Loucos sábios e livres, antes de Loucos patológicos que buscam libertar-se com aquilo que mais os escraviza, ofusca e aliena.

Importa contudo ir além do moralismo estreito e estéril e ver, através dum Natal e duma Festa de Loucos, o outro Natal e a outra Festa de Loucos cuja saudade no fundo secretamente move a avidez e a alienação deste grande Holocausto consumista. E, serenamente, transitar de um para o outro, sendo feliz e tornando-se contagioso. Ou seja, transitar das prisões do ego e das suas ilusões, individuais e colectivas, para a Grande Festa do Livre Espírito, na infinita comunidade de todos os seres vivos, da Vida e da Natureza. E dar expressão a isso, transformando o mundo-manicómio onde vivemos e antecipando nele alternativas ao seu colapso iminente. Com toda a sabedoria, amor, criatividade e riso de que formos capazes. Rir, sobretudo, de nós próprios.

FELIZ NATAL! LIBERTADORA FESTA DOS LOUCOS!

Paulo Borges

Paulo Borges é filósofo e escritor. Professor no Departamento de Filosofia e investigador do Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa. Presidente da Associação Agostinho da Silva e da União Budista Portuguesa. Vice-presidente da Associação Interdisciplinar para o Estudo da Mente. Director da revista Cultura ENTRE Culturas. Coordenador do Movimento Outro Portugal. Co-fundador e membro da Comissão Coordenadora do Partido pelos Animais e pela Natureza (PAN).

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

feliz natal meus amigos



Obrigada meus queridos

Arami, Udni, kendolechon, kendopitecus

Gracias pelas palavras pela música pelas imagens pelas partilhas por tudo o que me ensinaram, Arami por tudo o que me enviaste e chegou ao seu destino (um dia contarei ao Afonso…), pela presença pelos sorrisos pelas questões pelas tonterias pelas brincadeira por tudo…

Desejo-vos um Natal de coração cheio para dar e receber Amor e que o Novo Ano traga a renovação da vida em todos os sentidos e direcções

Um beijo muitos beijos (gosto muito de beijos :D) um abraço imenso doce e fraterno a todos vós e a ti kendopitecus um muito especial

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

obrigada Jan

Que te dizer? Que agora tenho uma deusa junto dos meus elfos e duendes, junto dos meus versos e contos, junto das minhas estrelas e planetas, junto dos meus sonhos…

Gosto muito muito

E gracias Jan pelas viagens que fiz nas tuas histórias pelos sentimentos que despertaste nas tuas pinturas e desenhos pela amizade e pela luz que me enviaste em dias de nevoeiro…

Dizia o poeta austríaco von Hofmannsthal que “a realidade é o maior dos encantamentos que alguém já experimentou”. Sejamos pois todos seres encantados!

Desejo-te um Natal cheio de Amor junto de todos os teus. Os que estão em teu redor e os que trazes dentro de ti.

Um abraço enorme




obrigada kendito




que precioso é receber presentes sem se esperar. Obrigada meu amigo. Pelos carquinoles :D

que eu nem sabia que existiam, mas que provei logo e são magníficos e um pouquito viciantes. Não se consegue comer só um…uma delícia para saborear à lareira com um Porto e conversas…

e kendito gracias pelo que aprendi contigo ao longo do ano pela amabilidade pela sensibilidade pela lógica pela doçura pelas palavras

Desejo-te um Natal abençoado junto de quem és e fazes feliz!

Um beijo grande

o menino que carregava água na peneira

Beatriz Trixis

Eu tenho um livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino
que carregava água na peneira.

A mãe disse que carregar água na peneira
era o mesmo que roubar um vento e sair
correndo com ele para mostrar aos irmãos.

A mãe disse que era o mesmo que
catar espinhos na água
O mesmo que criar peixes no bolso.

O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos.

A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio
do que o do cheio.
Falava que os vazios são maiores
e até infinitos.

Com o tempo aquele menino
que era cismado e esquisito
porque gostava de carregar água na peneira,

com o tempo descobriu que escrever seria
o mesmo que carregar água na peneira.

No escrever o menino viu
que era capaz de ser
noviço, monge ou mendigo
ao mesmo tempo.

O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.

Foi capaz de interromper o vôo de um pássaro
botando ponto final na frase.

Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.

O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor!
A mãe reparava o menino com ternura.

A mãe falou:
Meu filho você vai ser poeta.
Você vai carregar água na peneira a vida toda.
Você vai encher os
vazios com as suas
peraltagens
e algumas pessoas
vão te amar por seus
despropósitos

Manoel de Barros

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

murmúrios do silêncio



Tenho frio, murmurou-lhe o silêncio

Cobriu-o de versos de prosas de sonhos de desenhos de solidões de medos de passados de saudades de luz de asas de pétalas

Sentiu-o cansado de palavras

Tocou-o e deixou-se tocar

Sem fazer ideia do mar imenso em que se ia perder

domingo, 12 de dezembro de 2010

douce nuit


Crescente era o quarto da lua.


A noite tomava de emprestado o vermelho dos candeeiros seculares dispostos em redor da árvore imensa no centro da praça. No cimo dos edifícios, os sinos enfeitiçados pelo canto do vento, entoavam uma melodia muito antiga. Muito bela.


A mulher e a menina impregnadas de espanto olhavam.
Olhavam a árvore, os candeeiros, o vento, os sinos, a praça.


É mágico, mãe. Olha, consegues ver? – perguntou a menina apontando o dedo para o céu.


No ar flutuavam milhares de seres alados vindos do fim dos tempos, que lhes sussurrravam ladainhas ternas ao ouvido e fechavam as asas como quem se abraça devagar. Pareciam flocos de neve…


Podemos ficar assim para sempre? Podemos?


A mulher deslizou os dedos longos e macios pelo seu cabelo, acariciando-a e perguntou:
- É isso mesmo que tu queres pequenina?
- É! – respondeu sem pestanejar.


A mulher sorrindo pegou na mão da menina e começaram a subir a subir sentindo em cada asa o impulso imenso de um regresso a casa.





esta é uma história para recordar à lareira, com a Catarina, embrulhadas em mantas de lã e de ternura

sábado, 11 de dezembro de 2010

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

a lua




A essência dos significados da Lua surgiu devido à sua natureza mutável e nocturna. Em primeiro lugar, a lua muda constantemente de fase, perfazendo o seu ciclo em 28 dias.

A sua mutabilidade é devida à sua posição em relação ao Sol. Quando está conjunta a ele, desaparece, pois o brilho solar ofusca a Lua, e neste período ela parece ser “fecundada” pelo Sol. Na próxima fase, distancia-se do sol e começa a crescer (gravidez), quando entra na fase do oposição fica totalmente cheia, e “dá a luz”, iluminando a noite escura e por fim minguando, volta a aproximar-se do sol, que a ofusca novamente, até desaparecer e reiniciar o ciclo.

Este é o princípio Lunar, que deu origem aos maiores significados da Lua: é o arquétipo da grande mãe, é o feminino, a gravidez, as emoções, os sentimentos, os afectos, o cuidado, a protecção, a nutrição, a alimentação.

A mutabilidade da Lua representa a mutabilidade dos sentimentos e afectos humanos e também a instabilidade.

Outros significados da Lua advêm da sua natureza nocturna.
A noite, nos primórdios da humanidade, era sinónimo de perigo, medo, desconhecido. Como os homens estavam muito expostos ao ataque de animais, saqueamento de suas reservas por inimigos, etc., a noite e a escuridão tornaram-se o principal arquétipo de medo no inconsciente colectivo do homem. Outras qualidades dadas deste arquétipo à lua são de imaginativa, impressionável e influenciável. E também fantasia, criatividade, sonho.

A lua condiciona uma série de eventos na terra, graças à sua influência gravitacional, afectando as marés, o crescimento da vegetação e todos os ciclos naturais.

Sendo assim, podemos perceber que a Lua é um condicionador importante para o homem, e toda a experiência associada a outros factores planetários também será profundamente influenciada pela Lua, isto é pela nossa percepção emocional, pelos nossos condicionamentos inconscientes e pelos nossos mecanismos de defesa.

A lua astrológica também representa nossos medos e a nossa defesa emocional inconsciente e imediata frente aos estímulos ameaçadores. A lua é nossa identidade emocional, a forma habitual de reacção, os padrões instintivos de comportamento e os condicionamentos aprendidos na infância.
Também rege as experiências passadas, a memória emocional, o passado, a tradição.

Enquanto o Sol representa nosso Self consciente (luz do dia), a Lua representa o Ego inconsciente e o comportamento emocional adquirido inconscientemente (escuridão da noite).
Enquanto o Sol representa a parte masculina da psique humana a Lua representa a sua componente feminina “Anima”, daí seus significados de figura materna, mulher, nutrição, casa, protecção.

O Glifo

O glifo da Lua simboliza o meio círculo, e portanto uma fracção do todo, algo que falta para chegar ao todo, um vazio.
Este vazio é também um importante significado da lua, aquilo que falta para a plenitude, as carências, o que precisa de alimento ou nutrição para “encher”, ou completar.
O símbolo do meio círculo também simboliza a “alma”, o sentir ou o intuir. Este símbolo também encerra em si a noção de passividade - receptividade.

No mapa natal a lua é interpretada no signo e na casa em que está e nos aspectos que faz aos outros planetas.

A Lua rege o signo de Caranguejo e a casa IV, e está exaltada em Touro.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Florbela Espanca



Florbela da Conceição Espanca (1894 - 1930) nasceu e voluntariamente morreu em 8 de Dezembro, dia dedicado a N.Srª da Conceição, sua patrona.

domingo, 5 de dezembro de 2010

sete graus abaixo de zero


tombe la neige

(ontem em Bruxelas)

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010



”... estar ao mesmo tempo sonhando um poente real sobre o Tejo real e uma manhã sonhada sobre um Pacífico interior; e as duas coisas sonhadas intercalam-se uma na outra, sem se misturar, sem propriamente confundir mais do que o estado emotivo diverso que cada um provoca, e sou como alguém que visse passar na rua muita gente e simultaneamente sentisse de dentro as almas de todos...”.

Bernardo Soares (Livro do Desassossego)

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

que intervalo é este entre mim e mim?

.

Uma noite, um filme, o filme do desassossego, uma adaptação de “O Livro do Desassossego” escrito por Bernardo Soares ,semi-heterónimo de Fernando Pessoa.

O filme aparentemente impossível de realizar, pensamentos fragmentados do desassossego de Bernardo Soares, realizado de forma magnífica por João Botelho.


Gostei muito. E desassossegou-me….


A noite choveu. O que me faz diferente esta noite? Que desassossego passeio nesta noite de nevoeiro molhado que sulca na face uma lágrima, mistura de doce e salgado?

Fragmentos de pensamentos. Da noite.


que intervalo é este entre mim e mim?


as emoções, o corpo, as sensações, a vigília, os sonhos, os desejos os sentidos quando acordo de madrugada a esperança de algo antigo e tão frágil


que intervalo é este entre mim e mim?


um tempo imperfeito, abstrações, inquietações
não sei o que é. sei que está no meu peito
peregrina sigo devagar entre mim e mim


que intervalo é este?


de olhos fechados o frio perdido dentro de mim.
meço o tempo que chega de longe no meu rosto
abandono as palavras dentro da noite


que intervalo é este entre mim e mim?


é a calma na tempestade, as folhas que chovem do vento
as raízes desnudadas da árvore
o abandono sem medo a todos os caminhos
, um dia, entre mim e mim, um passo sem intervalos


Um filme. Uma noite. Um desassossego.




segunda-feira, 29 de novembro de 2010

foto: quinta da regaleira


Não tenhas medo de construir castelos no ar. É aí o seu lugar.

Mas uma vez que os sonhos tenham um lugar, é a tua tarefa construir os alicerces por baixo deles
.

Henry Thoreau

domingo, 28 de novembro de 2010

sagitário


Para todos os que têm o Sol em Sagitário, o seu Ascendente ou fortes energias de Júpiter no tema natal, este é o Arquétipo.



Polaridade: yang
Elemento: 3º signo do elemento fogo
Qualidade : mutável (final estação)
Planeta regente : Júpiter
Regente esotérico: Terra

O glifo de Sagitário é uma flecha (sagitta em latim), simplificação do símbolo do Centauro que aponta para o alto um arco, prestes a lançar uma flecha.

O centauro é uma criatura mitológica metade Homem metade cavalo. Tudo indica que se trata do centauro Quíron, um dos únicos centauros “amigos” do homem. Também foi Quíron o grande mestre de muitos heróis gregos, considerado sábio pelos próprios deuses do Olimpo. O símbolo do centauro representa a integração das polaridades: homem/animal. A parte humana está acima da animal, indicando os instintos domesticados pela consciência superior. Este centauro também é imortal e nele está contido o paradoxo – Humano/Divino. A seta apontando para o alto reflete a essência do signo: a busca do alto, a procura do conhecimento sagrado e universal que possibilita a sublimação da natureza mais básica do Homem. A flecha representa a procura cujo alvo está nas alturas. E ela liga este ser, meio Deus meio Homem, meio animal a algo que transcende todas estas condições. A flecha liga o mais baixo ao mais alto, a Terra ao Céu.

No ciclo anual das estações, Sagitário corresponde à passagem do Outono para o Inverno. Tudo o que deveria ter morrido já morreu e é tempo de preparação, para aqueles que sobreviveram, para o período mais duro, o tempo rigoroso do Inverno. Sagitário representa esta passagem, esta preparação interior. Este é o período onde a morte já foi aceite e interiorizada e neste estádio surge a Fé intuitiva e optimista de um ciclo que acaba para mais tarde recomeçar. Este ciclo de morte da natureza também abrirá um novo ciclo, que ultrapassa a matéria e as suas leis. Sagitário representa esse olhar para o futuro, para entender, significar e lidar com o presente. Esta Fé é como a neve que chega e magicamente protege as sementes que dormem no interior da terra à espera do momento único, do momento certo para poderem renascer. É preciso ter visão e uma compreensão do ciclo completo para entender o Inverno que se aproxima.

Como consequência evolutiva da fase anterior, o estádio de Sagitário representa a integração do que foi experienciado interiormente na fase de Escorpião. A morte do ego representa o nascimento do self. O Self é então uma estrutura na psique muito mais abrangente que passa a ser o centro consciente do indivíduo.

A energia Yang de Sagitário representa ultrapassar os limites daquilo que é pessoal, bem como as fronteiras psicológicas do ego e da ilusão de separação e de dualidade que ele trás consigo. Até esta fase o indivíduo experimentou tanto a noção de ego separado como fundido com o outro, mas em Sagitário surge a necessidade de ver-se inserido em algo maior, que não envolva um só outro mas todos os outros.

Por isso este signo representa a busca de uma verdade ou lei universal, que ultrapasse culturas, épocas e lugares. Esta busca tanto se manifesta através do impulso religioso como através de um sistema filosófico ou qualquer outro que permita o Homem compreender-se dentro de uma estrutura universal. A educação superior tanto no sentido de aprender como de ensinar estão profundamente ligadas a este signo.

Este estágio do ciclo representa também a transcendência de um estado físico para um espiritual. A compreensão da lei maior da existência, depois da vivência do nascimento (em Áries) e da morte (em Escorpião). A transcendência do instinto básico do homem – a sobrevivência.
Agora que já compreende intelectual e emocionalmente o ciclo da vida e morte, Sagitário procura o sentido da própria existência, o porquê maior de todo este processo, o objectivo da vida. Representa também a fé, a certeza absoluta, inquestionável na existência de uma inteligência superior que permeia todos os processos evolutivos.

Fascinado pelas diferentes culturas e religiões, Sagitário é o viajante aventureiro,inspirado por uma verdade universal que intui. E que irradia, sendo o arquétipo do mestre, do sábio professor.

O dom sagitariano é o de elevar os olhos para o céu, inspirar os outros ao que de mais elevado há na vida. O seu desafio evolutivo, ao contrário, é o de trazer o Céu à Terra. Sendo a Terra o seu regente esotérico, Sagitário é desafiado a ser o exemplo vivo e prático daquilo em que acredita e ensina. Trazer para a dimensão mais real, para a terra tudo o que ele concebeu noutra dimensão. A complexidade que ele capta deve ser traduzida na prática através da simplicidade.

No corpo humano Sagitário rege o fígado, coxas, quadris e região sacro-lombar.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

o fio das missangas

Um dia destes, quando saía de casa, deparei com meu vizinho, Jossinaldo. Estava no patamar, como que me esperando. Dos braços cruzados, espreitava uma trela. Me arrepiei. Sempre eu o tinha evitado, por causa dos ditos e desditos. O homem era conhecido pelo que fazia no parque: levava um peixe a passear pela trela. Caminhava na margem do lago, segurando a trela. No extremo da fita de couro estava amarrado, pela cauda, um gordo peixe. Jossinaldo era, nos gerais, tido por enjeitado: a cabeça do coitado, diziam, cabia toda num chapéu. E acresce-se que o temiam, sem outro fundamento que essa estanheza do seu fazer.

E agora lá estava ele, a tira pendente como uma língua que lhe emergia do corpo. Já eu remastigava uns apressados bons dias quando o vizinho se me interpôs e esticou o braço na minha direcção.

- Peço-lhe este favor!

Estremeci, receoso. Que favor? E era esse mesmo obséquio: o de ir eu substituí-lo no passeio ao peixe. Esquivei-me. O homem não desistiu: que ele estava-se sentindo doente, desvanecente e o peixe do lago não podia ficar órfão, sem ninguém para o conduzir, na fluência das águas.

- Por amor, não recuse!

… … …

- Vá, pegue na trela para ele lhe ganhar familiaridades.

Com o coração de fora, lá segurei na corda. O bicho veio à superfície da água e me olhou com olhos, até me custa escrever, com olhos de gente. E remergulhando me conduziu ele a mim, pela margem. Contornei por inteiro a lagoa para me reencontrar com Jossinaldo.

- Deixe-me despedir dele!

Ajoelhado sobre as águas, o vizinho falou palavras que não eram de língua nenhuma conhecida. Ficou, tenho medo de dizer, conversando com o peixe. Ergueu-se Jossinaldo, lágrima escorrendo, e me apertou as mãos, as duas em duplicado. Não falou, retirou-se em silêncio.

Sou eu agora quem, pela luz das tardes, passeia o peixe do lago. À mesma hora, uma misteriosa força me impele para cumprir aquela missão, para além da razão, por cima de toda a vergonha. E me chegam as palavras do vizinho Jossinaldo, ciciadas no leito em que desfalecia:

- Não existe terra, existem mares que estão vazios.

Dentro de mim, vão nascendo palavras líquidas, num idioma que desconheço e me vai inundando todo inteiro.

Mia Couto



quinta-feira, 25 de novembro de 2010

o minotauro

Em Creta
Onde o minotauro reina
Banhei-me no mar

Há uma rápida dança que se dança em frente de um toiro
Na antiquíssima juventude do dia
Nenhuma droga me embriagou me escondeu me protegeu
Só bebi retsina tendo derramado na terra a parte que pertence aos deuses

De Creta
Enfeitei-me de flores e mastiguei o amargo vivo das ervas
Para inteiramente acordada comungar a terra
De Creta
Beijei o chão como Ulisses
Caminhei na luz nua

Devastada era eu própria como a cidade em ruína
Que ninguém reconstruiu
Mas no sol dos meus pátios vazios
A fúria reina intacta
E penetra comigo no interior do mar
Porque pertenço à raça daqueles que mergulham de olhos abertos
E reconhecem o abismo pedra a pedra anémona a anémona flor a flor
E o mar de Creta por dentro é todo azul
Oferenda incrível de primordial alegria
Onde o sombrio Minotauto navega

Pinturas ondas colunas e planícies
Em Creta
Inteiramente acordada atravessei o dia
E caminhei no interior dos palácios veementes e vermelhos
Palácios sucessivos e roucos
Onde se ergue o respirar da sussurada treva
E nos fitam pupilas semi-azuis de penumbra e terror
Imanentes ao dia
Caminhei no palácio dual de combate e confronto
Onde o Príncipe nos Lírios ergue os seus gestos matinais

Nenhuma droga me embriagou me escondeu me protegeu
O Dionysos que dança comigo na vaga não se vende em nenhum mercado negro
Mas cresce uma flor daqueles cujo ser
Sem cessar de busca e se perde se desune e se reúne
E esta é a dança do ser

Em Creta
Os muros de tijolo da cidade minoica
São feitos de barro amassado com algas
E quando me virei para trás da minha sombra
Vi que era azul o sol que tocava o meu ombro

Em Creta onde o Minotauro reina atravessei a vaga
De olhos abertos inteiramente acordada
Sem drogas e sem filtro
Só vinho bebido em frente da solenidade das coisas
Porque pertenço à raça daqueles que percorrem o labirinto
Sem jamais perderem o fio de linho da palavra

Sophia Mello Breyner

quarta-feira, 17 de novembro de 2010


vou ali. e já volto.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

um dia

foto de Joanna Nowakowska


Um dia, quando a ternura for a única regra da manhã, acordarei entre os teus braços, a tua pele será talvez demasiado bela e a luz compreenderá a impossível compreensão do amor.
Um dia, quando a chuva secar na memória, quando o Inverno for tão distante, quando o frio responder devagar com a voz arrastada de um velho, estarei contigo e cantarão pássaros no parapeito da nossa janela, sim, cantarão pássaros, haverá flores, mas nada disso será culpa minha, porque eu acordarei nos teus braços e não direi nem uma palavra, nem o princípio de uma palavra, para não estragar a perfeição da felicidade.

José Luís Peixoto

domingo, 14 de novembro de 2010

.
Nós nascemos, por assim dizer, provisoriamente, em algum lugar;
pouco a pouco é que compomos, em nós, o lugar de nossa origem,
para lá nascer mais tarde e, a cada dia, mais definitivamente.

Rainer Maria Rilke




quinta-feira, 11 de novembro de 2010

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

na tua face


debruçamo-nos da janela e o mar existiu logo na transcendência de nós, no sem-fim espraiado e todavia apaziguado da sua inquietação.

víamo-lo em baixo, aberto de toalhas rendadas de espuma para o invisível da graça que devia sorrir em nós.

e havia o azul intenso da sua origem.

e havia em nós o silêncio para tudo poder falar.

Vergilio Ferreira

sexta-feira, 5 de novembro de 2010



Húmido de beijos e de lágrimas,
ardor da terra com sabor a mar,
o teu corpo perdia-se no meu.

Eugénio de Andrade

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

para Jan





hoje o sol retorna à mesma posição que estava quando nasceste

hoje o sol retorna

para novos começos

o Início

um dia feliz muito feliz amigo meu

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

um pouco de Astrologia

ando a reler Vergílio Ferreira e a rever as aulas de astrologia do Nuno Michaels. entre os dois hesito...e vá-se lá saber porquê hoje escolho a astrologia

O Significado e o Propósito do Signo Ascendente

O que é o Ascendente?

É o signo do Zodíaco que surge no horizonte no momento exacto do nascimento, visto de um local específico.

O Ascendente representa a energia específica do instante em que nascemos, a “aura” desse momento único. É a essência desse momento que não se repetirá, a qualidade energética que nos deu as boas vindas ao chegarmos à existência. É como se representasse a maneira como cada um chega à vida ou a energia que estava disponível para nos receber. Como a Astrologia tem uma linguagem simbólica e um símbolo pode ser interpretado em muitos sentidos e a níveis diferentes, o Ascendente representa várias coisas em simultâneo.

Em termos físicos, e porque é calculado para o momento em que o corpo entra em contacto directo com o ambiente de uma forma individualizada, o Ascendente representa o corpo físico e a nossa aparência, o “veículo” que utilizaremos ao longo da vida para nos expressarmos e relacionarmos com o mundo. Ao longo da vida representa a imagem que projectamos sobre os outros, o nosso contacto espontâneo com o ambiente imediato, a imagem com que num primeiro contacto os outros ficam de nós, antes de nos conhecerem mais profundamente.

Em termos psicológicos, o Ascendente representa uma espécie de “marca psíquica” ligada às circunstâncias em que nascemos e que qualifica muitas vezes a forma como “nascemos” para as novas experiências da vida, como começamos as coisas, como nos projectamos espontaneamente no ambiente em redor, como nos afirmamos.

No teatro grego, a máscara que o actor usava para representar o seu papel numa tragédia ou numa comédia era chamada persona. A persona não era o actor mas a máscara usada para interagir com os outros actores. Em certo sentido o Ascendente é a nossa persona, que usamos para interagir com o mundo exterior e com os outros, uma espécie de “segunda pele” que funciona não só como uma capa exterior que é percepcionada pelos outros mas também como uma película psíquica que filtra a nossa própria percepção do Mundo.

Imaginem um guerreiro no tempo das Cruzadas. O Ascendente é a armadura que o guerreiro veste para travar a batalha, o equipamento que ele usa para cumprir o seu propósito. O propósito da batalha é simbolizado essencialmente pelo sol no mapa astrológico, porque o sol representa o processo de conquista progressiva de consciência ao longo da vida de modo a nos tornarmos quem nascemos para ser, para nos conhecermos e cumprirmos; mas o Ascendente qualifica o tipo de armadura e as suas características e assim informa sobre o estilo de combate e a forma como esse combate é travado.

Dito de outra forma, é como se o Ascendente simbolizasse um dos principais “temas” da vida: o que temos que aprender a fazer e a ser para “agarrar” a vida e a sua encarnação; quais os principais desafios colocados pela vida até desenvolvermos as qualidades que nos permitirão “abrir” o potencial do signo solar e poder expressá-lo criativamente na vida.

Isto permite-nos refletir sobre quais são as tarefas, os propósitos mais importantes de cada signo Ascendente.

doçuras ou travessuras?



Chegam pé ante pé calando os risinhos com o dedo nos lábios. Batem com força na porta da rua. Sei-os de cor. Cinco ou seis anos vestidos de fantasmas e bruxinhas. Um feitiço qualquer mantem a vela tremeluzente no interior da cabaça esculpida.

Doçuras ou travessuras? Travessuras ou doçuras?

Travessuras não por favor, que medo! Entro nas suas brincadeiras. Doçuras doçuras… Deliciados e felizes abrem os saquitos onde se amontoam castanhas romãs bolos de noz maçã e canela…

Doçuras. Vou buscá-las à cozinha acabadinhas de fazer. Broas de todos-os-santos. A receita da minha avó. Que deposito no saco e na memória inundada subitamente de cheiros e palavras.

Agraciada por risos e beijos soprados na ponta dos dedos fico a vê-los correr pé ante pé para a porta do lado.

...

...

Aqui deste lado bato levemente a outra Porta. Doçuras ou travessuras? Pé ante pé atravesso-a.

É tão real o cheiro a broas de todos-os-santos acabadas de fazer.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

metáforas II

"olha como as nuvens choram"

há pouco
na minha cidade

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

as primeira metáforas



Houve um homem,
anterior a estes e ao abismo.

Chovia. O homem apontou
o céu e disse:
«olha como as nuvens choram»
Foi o primeiro.

As palavras eram ainda leves
e, naturalmente, era também possível
dizer coisas belas e imprevistas
como um relâmpago.

Paulo Tavares

domingo, 24 de outubro de 2010

estarás aqui amanhã?

Um atrevido raio de sol penetra suavemente pela fresta da persiana, pintando de ouro a minha mão que entretida desenha círculos e círculos na madeira do soalho. Olho cautelosamente na direcção da luz. Partículas de poeira flutuam descordenadamente como adolescentes que aprendem a mover-se num corpo a crescer.

Passado presente na memória. Recordo a luz do bosque que se abria a poucos passos da porta da minha distante casa num tempo distante.

Estarei aqui amanhã?


Volto o meu rosto e olho para ela.

Os seus olhos são ternos, calmos e atentos. Emitem a alegria silenciosa de uma criança que olha para dentro de um tempo acabado de descobrir.

Sinto como se não houvesse bem ou mal no mundo – só eu e ela. E sinto também algo mais. Pequenos fragmentos de sentimentos opostos e verdadeiros. Inquietude e serenidade.


Talvez eu parta, digo. E penso para mim que não sei muito bem o que isso significa.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

para a catarina

O que vou ser quando crescer, costumavas perguntar
E eu respondia: livre, livre, livre….
E corrias em gargalhadas ensaiando a liberdade


Agora crescida perguntas-me, o que vou ser?
e eu murmuro-te livre, livre, livre…
e tu voas experimentando a liberdade



sábado, 9 de outubro de 2010

Dado que só se exprime através do som e tem lugar num tempo determinado, a música é, por natureza, efémera.

O que é essencial na execução da música e difícil na vida é começar sempre do zero.

De cada vez que executamos de novo uma obra, temos de o fazer com a frescura de um primeiro encontro e a intensidade de um último.

É muito difícil ter a coragem e a capacidade de começar do nada, analisando a experiência colhida no passado e depois recomeçar a pensar, em termos diferentes.


in Está Tudo Ligado. O Poder da Música. Daniel Barenboim


terça-feira, 5 de outubro de 2010




Creio nos anjos que andam pelo mundo,
Creio na deusa com olhos de diamantes,
Creio em amores lunares com piano ao fundo,
Creio nas lendas, nas fadas, nos atlantes;


Creio num engenho que falta mais fecundo
De harmonizar as partes dissonantes,
Creio que tudo é eterno num segundo,
Creio num céu futuro que houve dantes,


Creio nos deuses de um astral mais puro,
Na flor humilde que se encosta ao muro,
Creio na carne que enfeitiça o além,


Creio no incrível, nas coisas assombrosas,
Na ocupação do mundo pelas rosas,
Creio que o amor tem asas de ouro. Amém.


Natália Correia

domingo, 3 de outubro de 2010

koan



Batendo duas mãos uma na outra temos um som;
qual é o som de uma mão?"


(tradição oral, atribuida a Hakuin Ekaku, 1686-1769).



Koans…

Sem respostas certas sem respostas erradas….
Pequenos enigmas respondidos com a intuição
Deixando de lado a mente lógica e racional

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Fechei os olhos para não te ver
e a minha boca para não dizer...


E dos meus olhos fechados
desceram lágrimas que não enxuguei,
E da minha boca fechada
nasceram sussurros


E palavras mudas que te dediquei...


Mario Quintana


sexta-feira, 24 de setembro de 2010

o amor, meu amor



Tu me bebes
e eu me converto na tua sede.
Meus lábios mordem,
meus dentes beijam,
minha pele te veste
e ficas ainda mais despida.

Pudesse eu ser tu
e em tua saudade ser a minha própria espera

Mas eu deito-me no teu leito
quando apenas queria dormir em ti.

E sonho-te
quando ansiava ser um sonho teu.

E levito, voo de semente,
para em mim mesmo te plantar
menos que flor: simples perfume,
lembrança de pétala sem chão onde tombar.

Teus olhos inundando os meus
e a minha vida, já sem leito,
vai galgando margens
até tudo ser mar.
Esse mar que só há depois do mar.

Mia Couto

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

il y a toujours




La nuit n'est jamais complète
Il y a toujours puisque je le dis
Puisque je l'affirme
Au bout du chagrin une fenêtre ouverte
Une fenêtre éclairée
Il y a toujours un rêve qui veille
Désir à combler faim à satisfaire
Un coeur généreux
Une main tendue une main ouverte
Des yeux attentifs
Une vie la vie à se partager.


Paul Eluard

terça-feira, 21 de setembro de 2010

para kendito


um abraço ENORME de Parabéns

domingo, 19 de setembro de 2010

iluminação

fechar os olhos e sentir

o caminho da alma

sábado, 11 de setembro de 2010




explicar com palavras deste mundo

que partiu de mim um barco

levando-me

Alejandra Pizarnik

sexta-feira, 3 de setembro de 2010



O que aconteceria se você dormisse?

E depois sonhasse?

E no sonho fosse até o céu e

colhesse uma estranha e bela flor?

E quando acordasse,

tivesse a flor na mão?


Ah! E então?



S. T. Coleridge

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

para quem precisar


no secobra...

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Ora (direis) Ouvir Estrelas!



"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso! “E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto ...

E conversamos toda a noite, enquanto
A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas.

Olavo Bilac

terça-feira, 31 de agosto de 2010

ironia do destino?

pensou que tinha o destino traçado
quando um traço mudou o seu destino



Agora é tarde demais, disse o mais novo dos agentes ao observar o corpo sem vida, do jovem escritor, caído sobre a palavra que acabara de traçar.

O outro agente semicerrou os olhos para melhor poder ver o que ocultava o cenário. Suicídio? Assassínio? – perguntou.

Foi o destino, proclamou o terceiro, com um ar muito sério. Não deixa de ser irónico, descobrir que é possível e morrer. Ou será que tinha que morrer para ser possível?

Entreolharam-se em silêncio.

Vamos então, disse o primeiro.

Aonde? - indagaram curiosos.

À procura do destino. Tenho umas quantas perguntas que gostava de lhe fazer.

sábado, 28 de agosto de 2010

dreamer




shadow dancer will you walk with me tonight

in a dream we will awaken

we could walk a million miles before the day breaks

while the world is deeply sleeping


Me has enseñado a no cortar las flores.

He sospechado que tú eres cómplice de su crecimiento.

Roberto Juarroz

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

instantes

O relógio parado

Um grão de areia

Um mar sem vagas

O silêncio das palavras

Momentos sem tempo




Escritos durante a noite

Numa língua por inventar

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

noite de lua cheia


ontem, a lua deu toda a sua luz à noite

terça-feira, 24 de agosto de 2010


é bom deixar um pouco de ternura em cada lugar

domingo, 22 de agosto de 2010

para o Afonso

tenho nas mãos uma história para te contar

à espera que acordes e regresses
das entranhas dos sonhos e dos tempos

tenho nas mãos uma história
de coisas mágicas e invisíveis

à tua espera



sexta-feira, 20 de agosto de 2010

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

mi vida en tus manos



ou a tua vida nas minhas mãos

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

cadena de favores



Quando uma pessoa se dispõe a amar uma outra,

provoca uma reacção de amor em cadeia

que continua indefinidamente

sábado, 14 de agosto de 2010

se eu tivesse




Se eu tivesse as sedas bordadas do céu,
com bainhas de luz de ouro e de prata,
as sedas azuis e sombrias e escuras,
da noite e da luz e da meia-luz,


deitava-as todas aos teus pés.


Mas eu sou pobre e só tenho os meus sonhos.
Deitei-os todos aos teus pés.
Pisa com cuidado,
é nos meus sonhos que estás a pisar.


W. B. Yeats

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

quarta-feira, 11 de agosto de 2010




anda perdida
a ave que ousou rasgar a sombra dos plátanos
em pleno estio
à procura….

domingo, 8 de agosto de 2010

contraluz



António Feio, actor e encenador muito conhecido e querido entre nós partilhou esta mensagem com milhares de portugueses pouco tempo antes da sua morte ocorrida há uns dias atrás.

Contraluz.

Fui ver o filme. E gostei. Muito. Histórias dentro de histórias. Sinais. Dar-nos conta dos momentos que acontecem. Viajar no tempo. (Re)encontros que nos salvam…

Just – como o nome do homem… Just in time.

“Aproveitem a vida e ajudem-se uns aos outros. Apreciem cada momento. Agradeçam e não deixem nada por dizer nada por fazer.”

Obrigada António.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010



Há quem diga que todas as noites são de sonhos.

Mas há também quem garanta que nem todas, só as de verão.

Mas no fundo isso não tem muita importância.
O que interessa mesmo não são as noites em si são os sonhos.

Sonhos que o homem sonha sempre.
Em todos os lugares, em todas as épocas do ano, dormindo ou acordado.

William Shakespeare

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

sei das palavras que conheço
das que dou como um presente invisível
num piscar de olhos num sorriso num toque de ombro

sei das palavras que invento
e deixo escritas em livros que se somam
em prateleiras imaginárias

sei das palavras que não digo
das ficam a pairar nos olhos e no silêncio

e quando as palavras que conheço não me bastam
vou de braços estendidos e olhos vendados
procurar uma réstia da voz conhecida

é então que descubro novamente as palavras que me ensinaste



segunda-feira, 2 de agosto de 2010

andanças


o Andanças é um festival de dança e música popular de todo o mundo, em que quem toca e quem dança se junta para formar um colectivo que é muito mais que a mera soma das partes.

Dias de partilha, descoberta, convívio, relação com o outro, aprender ou experimentar a dançar, jogar, tocar, construir instrumentos e brinquedos tradicionais, passear pela serra, de se aventurar em novos espaços com pessoas diferentes (ou não) das que se encontram todos os dias.

Há 4 anos que reservo uns dias de férias para ir até S.Pedro do Sul participar nestas “andanças”. O ambiente que se vive que se respira que se dança é para mim único.

O dia começa com atelieres de yoga, meditação, chi kung, massagens a preparar-nos para o que vem. Que são as danças - 6 oficinas a decorrer simultaneamente, de manhã e à tarde. Danças de todo o mundo – de roda, de pares, singulares, como guiar. Ao fim da tarde novamente yoga, meditação…

E à noite praticar o que se aprendeu. Usar o espaço em harmonia com os outros, improvisar. Não são precisas palavras para partilhar.

Desejo a todos que de uma maneira ou de outra dancem. Se aventurem. Dancem com a vida. Sempre.

Um abraço enorme e redondo a todos.



domingo, 1 de agosto de 2010



magia? ou poesia?

há mar


há mar e mar
há ir e não querer voltar

segunda-feira, 26 de julho de 2010

vou partir



oiço o breve adágio do mar que me chama...

domingo, 25 de julho de 2010

soneto do amor total



Amo-te tanto, meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.

Amo-te afim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.

Vinicus de Moraes