Conta-me um conto. Para eu adormecer, pediu ela. Há cinco noites que não consigo dormir.
Olhou-a dentro do seu olhar como se pudesse ver todo o cansaço que a voz expressava. Vem, disse, tacteando o ar à procura do seu corpo. Encosta-te a mim. Isso. Assim. Abraçou-a com muito cuidado uma mão no seu ombro o queixo poisado sobre os seus cabelos. O olhar perdido – tinha-o perdido há quanto tempo? – num infinito distante.
Inventou uma história. Feita de palavras soltas e de memórias que o habitavam do tempo que havia antes de existir. Esqueceu que não podia ver e descreveu as aves misteriosas trazidas do interior do sol. As cores que descem na noite a cada instante. As vozes que chegam pelas mãos que seguram os sonhos. A lua azul profunda. As pedras que guardam os pensamentos. As tatuagens gravadas sob a pele dos guerreiros…
A sua voz rouca amornava o ar. Sobre eles uma mão invisível tecia lentamente a noite.
Sentiu o corpo dela abandonar-se no seu peito. A respiração pouco a pouco mais profunda. De quem entra no sono. De quem entra no sonho.
E continuou a falar para que o silêncio a não despertasse.
Ela adormecida era o olhar que o guiava na rota dos sonhos. Ele acordado era a voz que aprendia o caminho para a terra prometida.
E por quê a gente sempre anda a pedir-te contos? Não vai ser que escreves mesmo muito bem?
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