“Sou entre flor e nuvem. Por que havemos de ser unicamente humanos? Não encontro caminhos fáceis de andar. E por isso levito. É bom deixar um pouco de ternura em cada lugar” (Cecília Meireles)
sábado, 8 de dezembro de 2012
“Why do you go away? So that you can come back. So that you can see the place you came from with new eyes and extra colors. And the people there see you differently, too. Coming back to where you started is not the same as never leaving.”
Nascido do frio e da vertigem
um teimoso sol desponta em cada madrugada
com esse sol renasce também em cada homem
a esperança de um dia novo
distinto
absoluto e diferente
em que tudo pudesse acontecer
pela primeira vez
enchem-se então os olhos de espanto e de memória
e rebenta-nos uma saudade enorme do futuro
e uma sede tranquila de infinito
e em cada novo dia reaprendemos o ciclo
e em cada novo dia nos apaixonamos
e desistimos
e ressuscitamos
do enorme chão de água que nos cerca
Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio.
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há ideias apenas.
Há só cada um de nós, como uma cave.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.
Tu que tens dez réis de esp'rança e de amor
Grita bem alto que queres viver.
Compra pão e vinho, mas rouba uma flôr:
Tudo o que é belo não é de vender.
Não vendem ondas do mar,
Nem brisa ou estrelas,
Sol ou lua-cheia.
Não vendem moças de amar,
Nem certas janelas
Em dunas de areia.
Canta, canta como uma ave ou um rio,
Dá o teu braço aos que querem sonhar.
Quem trouxer mãos livres ou um assobio
Nem é preciso que saiba cantar.
Tu que crês num mundo maior e melhor
Grita bem alto que o céu 'stá aqui.
Tu que vês irmãos, só irmãos, em redor
Crê que esse mundo começa por ti.
Traz uma viola, um poema,
Um passo de dança,
Um sonho maduro.
Canta glosando este tema:
Em cada criança
Há um homem puro.
Canta, canta como uma ave ou um rio,
Dá o teu braço aos que querem sonhar.
Quem trouxer mãos livres ou um assobio
Nem é preciso que saiba cantar.
O meu jardim amanhecera
Constelado de brancas margaridas,
Que orvalhadas, ao sol, eram estrelas
Desencantadas e pensativas...
Depois, na tarde azul e triste,
A terra abriu-se para receber-te!
Adormeceste para sempre,
Baixando à terra com as margaridas...
E à noite o céu era um jardim do Oriente
Florindo em luzes pela tua vinda!
É hora de partir, meus irmãos, minhas irmãs.
Eu já devolvi as chaves da minha porta
E desisto de qualquer direito à minha casa.
Fomos vizinhos durante muito tempo,
E recebi mais do que pude dar.
Agora, vai raiando o dia,
E a lâmpada que iluminava o meu canto escuro
Apagou-se.
Veio a intimação e estou pronto para a minha jornada.
Não indaguem sobre o que levo comigo.
Sigo de mãos vazias e o Coração confiante.
tenho um livro que faz referência a uma peça de teatro - Yolk Life - escrita por Oddur Bjorsnsson, que tenho andado à procura.... os personagens são fetos gémeos de oito meses. Um dos gémeos é racionalista que aceita o ambiente que o acolhe como o único que ele pode alcançar. O outro gémeo é mais complexo, parece ser fraco e dependente mas tem uma intuição que requer expansão. Acaba por ter uma sensação estranha a respeito de uma outra forma de vida para além da fetal...
transcrevo-vos a última fala da peça, do feto 2:
"você não poderia imaginar um mundo grande, um mundo cem mil triliões de vezes maior do que nós, onde a luz não fosse tão escura e a escuridão não fosse tão clara, onde houvesse seres iguais a nós e diferentes de nós, onde houvesse pianos e cachorros, escritores e cadeiras para nos sentarmos, catálogos de encomenda e homens como os das histórias de fantasmas e....como se chamam mesmo?...mulheres que se multiplicam! E mais espaço para a cabeça, para que pudessemos ficar em pé. Beethoven, para que todos os pianos pudessem ser tocados. Penicos e fotografos de óculos. E todo o tipo de coisas possíveis. E também todo tipo de coisas impossíveis. Hein? Você pode imaginar? Não pode realmente imaginar?"
o feto 1 dá uma resposta rápida: "Não."
a peça termina na escuridão, em silêncio total.
ficamos nós com este dilema.... supondo que o nascimento visto do interior do útero é sentido como morte será que a morte, vista do lado de fora do corpo, será um nascimento?
Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol.
Ambos existem; cada um como é.
Alberto Caeiro - Poemas Inconjuntos
terça-feira, 24 de abril de 2012
o homem que está apaixonado encontra um búzio na margem. quando o leva ao ouvido, não ouve o mar, nem o vento, nem os anjos, mas só a sua própria voz cantando: amo-te. nunca ouvira nada tão belo.
na outra margem, todos os homens dormem. alguém caminha lentamente ao longo da praia, leva-os um a um ao ouvido, escuta. nalguns desses búzios humanos ouve cães a ladrar, noutros tigres rugir na imensidão ou então martelos a ressoar, e noutros ainda crescer o crescer das máquinas. mas num deles ouve ecoar o grito de um peixe. é o som que faz o homem que está apaixonado quando alguém o leva ao ouvido.
se os planetas pudessem amar, deixariam a sua órbita e provocariam o caos. a salvação do mundo deve-se ao facto de o amor ser impossível. o homem que está apaixonado adivinha, também ele sabe, que o amor é gémeo da morte. mas isso não o impede, a ele que é prisioneiro do seu destino, de entrar de rompante na cela do seu vizinho gritando de alegria: sou livre!
Y FUE a esa edad... Llegó la poesía
a buscarme. No sé, no sé de dónde
salió, de invierno o río.
No sé cómo ni cuándo,
no, no eran voces, no eran
palabras, ni silencio,
pero desde una calle me llamaba,
desde las ramas de la noche,
de pronto entre los otros,
entre fuegos violentos
o regresando solo,
allí estaba sin rostro
y me tocaba.